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Bairros de Fortaleza ainda ignoram isolamento social contra Covid-19
Redação
Moradores do Monte Castelo seguem rotina e se aglomeram em quadra do bairro - FOTO: CAMILA LIMA

A Covid-19 ameaça a integridade clínica de ricos e pobres. O coronavírus, vetor da doença pandêmica, não segrega classes econômicas. Dessa forma, qualquer pessoa que descumpra a etiqueta de prevenção pode ser contaminada. Em algumas áreas de Fortaleza e Região Metropolitana, contudo, o isolamento social ainda não alcançou todos os moradores. O vai e vem de pedestres, as conversas aglomeradas nas calçadas e as brincadeiras na rua persistem.

No Montese, em plena luz do dia, uma praça do bairro reunia sete homens adultos, uns em pé e outros sentados nos bancos construídos debaixo de árvores. A recomendação de contato físico a pelo menos um metro de distância sequer foi cumprida. Em outro ponto, quando o céu já estava escuro, duas casas em uma vila estavam com portões abertos e cadeiras nas calçadas. Uma idosa participava da conversa lado a lado com os demais vizinhos.

Já no Monte Castelo, a movimentação de pessoas no entorno da quadra de areia do bairro era intensa. A partida de futebol das crianças acontecia normalmente, assim como a caminhada ao ar livre e o passeio com o bicho de estimação. Nas ruas próximas, havia mais pessoas fora de casa, em rodas de conversa, transitando a pé e de bicicleta ou ainda caminhando com bebês.

Movimento

O cenário se repete no José Walter. Jovens ocupam a quadra para atividades de recreação com bola. No mesmo espaço, porém, um trio de meninas produzia vídeos de dança para a internet com a ajuda de uma quarta pessoa, que filmou a coreografia. No bairro vizinho, no Planalto Ayrton Senna, crianças apostavam corrida de bicicleta e adultos foram vistos caminhando juntos, alheios às recomendações de especialistas.

A recusa às orientações de sair de casa somente em caso de necessidades, como trabalho e unidade de saúde, tem sido notada também no João XXIII. A prática de exercícios e atividades físicas na praça do bairro ainda reúne muitas pessoas. De um lado, homens praticando musculação e do outro, futevôlei. Esta última, com o maior número de público dentro e fora da quadra.

No bairro Jurema, em Caucaia, a reportagem flagrou moradores enfileirados comprando frutas e verduras em uma barraca montada na frente de uma residência. Bem próximo, um grupo de homens de faixas etárias diferentes jogava dominó.

Segundo o lutador profissional Thiago Silva, 33, que mora na comunidade do Campo do América, no Meireles, os moradores ignoram as orientações sob a justificativa de que a doença é sazonal, típica da quadra chuvosa. “Eles acham que não passa de uma gripe. A gente fala dos riscos, que qualquer pessoa pode ser contaminada, mas ainda assim, o comportamento continua”, alega.

A rotina no bairro, ele cita, segue sem alterações: calçadas cheias e rodas de conversa. “Eles só vão entender quando um amigo ou algum familiar deles for diagnosticado com coronavírus”, diz o lutador, lamentando ainda a desobediência. “Eu sinto que é praticamente um trabalho em vão. Eu faço minha parte, mas eles não colaboram e isso prejudica a saúde de toda a minha família”.

Desde que o primeiro caso de coronavírus foi confirmado no Brasil, o corpo técnico do Ministério da Saúde tem recomendado o isolamento domiciliar para evitar a disseminação da doença. Em âmbito estadual, o governador Camilo Santana baixou decreto estabelecendo a suspensão de atividades coletivas e o fechamento de estabelecimentos comerciais, como academias, lojas de roupas, além de escolas e igrejas.

Vulnerabilidade

Com exceção de farmácias, hospitais, clínicas veterinárias e supermercados, todos os demais serviços estão suspensos até o dia 29 de março. A medida para contenção da Covid-19, que já infectou 211 pessoas no Ceará, tem o reforço ainda da Polícia Militar, que monitora aglomerações nas ruas de todo o Estado.

A Secretaria Estadual da Saúde (Sesa) não divulga oficialmente os casos confirmados da doença por bairro em Fortaleza. O titular da Pasta, Carlos Roberto Martins Rodrigues Sobrinho, Dr. Cabeto, informou que 80% dos infectados pelo coronavírus moram nos bairros Aldeota, Meireles, Papicu e Varjota, considerados área nobre da Capital.

A possibilidade de a doença se proliferar em regiões socialmente mais vulneráveis, no entanto, preocupa o presidente da Central Única das Favelas (Cufa), Preto Zezé. O receio surge, ele explica, porque há uma parcela da população que não possui condições estruturais para sequer conseguir cumprir o período de reclusão social.

“Tem lugares, por exemplo, que não têm água para lavar as mãos, não tem álcool em gel, não tem nem o que comer. Como é que faz a quarentena? O cara da favela faz uma escolha trágica que é ir para a rua correr o risco de pegar coronavírus, mas arranjar um dinheiro e pagar as contas. Quarentena é para quem tem minimamente uma estrutura”, considera.

Conforme levantamento da Cufa, divulgado neste mês, 13,6 milhões de brasileiros moram em comunidades no Brasil. No Ceará, onde vivem 9,1 milhões de pessoas segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 5% da população reside nessas áreas. O número, igual ao de Alagoas, é inferior aos estados de Pernambuco (10%) e Bahia (7%). Já Piauí, Alagoas e Sergipe têm 4%, enquanto Paraíba e Rio Grande do Norte, 3%, sendo as menores proporções.

“Nós precisamos garantir a proteção social dessas pessoas com políticas emergenciais e pautar essas questões com o Governo”, defende Preto Zezé. Ele aponta que a Cufa elaborou uma lista com alternativas de prevenção ao coronavírus nas comunidades. Entre as recomendações enviadas ao Poder Público estão o repasse de itens de higiene, aluguel de hotéis e pousadas para idosos e liberação de pontos de internet para facilitar o acesso de informações sobre a Covid-19.

Diário do Nordeste

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