A alta demanda pelo teste em Fortaleza tem feito clínicas e laboratórios particulares organizarem lista de espera FOTO: MAURO PIMENTEL / AFP
A procura pelo exame que detecta a contaminação pelo coronavírus Sars-CoV-2 acompanha o crescimento acentuado de casos de Covid-19 no Ceará. A alta demanda pelo teste em Fortaleza, por exemplo, tem feito clínicas e laboratórios particulares organizarem lista de espera, que pode chegar a dez dias e com risco de cancelamento. Por outro lado, quem já conseguiu fazê-lo precisa lidar com a ansiedade para o resultado, uma vez que os prazos de entrega nem sempre estão sendo cumpridos.
O Diário do Nordeste entrou em contato com três estabelecimentos de Saúde que coletam amostras de pacientes para a produção do diagnóstico. O pedido de informação sobre a disponibilidade do exame foi feito por telefone. Nem todas as respostas solicitadas, no entanto, foram repassadas. A justificativa, disse uma atendente, está na “procura intensa” pelo teste.
Na primeira tentativa de “marcação” do exame, o telefonista explicou que os testes acontecem somente em domicílio. Pacientes idosos não pagam, enquanto profissionais da saúde, apenas a taxa da coleta no valor de R$ 60. Nem todos os convênios cobrem o exame. Nesse caso, o exame custa R$ 330.
O agendamento não é imediato. “Tem fila de espera, e o paciente precisa ter a notificação do SUS e a solicitação médica. E eu só tenho vaga para depois do 16 de abril, porque a demanda está muito grande”, informou, complementando que o resultado é liberado de 7 a 8 dias úteis.
Critério
Já em um outro laboratório procurado, o exame é feito mediante manifestação clínica dos sintomas da Covid-19 na emergência de dois hospitais privados, onde estão concentradas a realização dos testes. O paciente dee dar entrada pela emergência de alguma das unidades, passar por triagem e em seguida, pelo médico plantonista, que vai avaliar a necessidade de solicitar o exame. O tempo médio para sair o diagnóstico é de até cinco dias úteis.
Um hospital ponderou à reportagem que “há fila por conta da demanda e uma demora razoável”, sem detalhar o prazo para acesso ao exame. A unidade obedece a critérios de prioridade para pacientes graves e internados, assim como profissionais de saúde sintomáticos. Eles podem aguardar até oito dias úteis para a entrega do resultado do teste.
Contudo, a oferta de kits ainda não é suficiente para que seja implementada uma testagem massiva, ainda que na presença de sintomas. Após voltar de viagem, a advogada Maria Socorro de Lima, 54 anos, começou a ter febre, tosse seca, olfato comprometido e falta de ar, o que a fez ligar para o TeleSaúde do governo do Estado. Foi orientada a ficar em isolamento social durante 14 dias, mas os sintomas evoluíram.
Ao buscar ajuda em um hospital particular, no dia 31 de março, encontrou a primeira negativa. “Queriam me colocar em isolamento, mas só fariam o exame se entrasse num quadro de falta de ar aguda e que precisasse me entubar em UTI”, descreve. Embora tenha conseguido a solicitação com um outro médico para fazer o exame em um laboratório, não conseguiu fazer a testagem por indisponibilidade das clínicas.
“Eu estou numa indignação do tamanho do mundo, é uma situação desumana”, considera a advogada, que continua com os sinais da doença. “Eu estou sem força para fazer as atividades de casa. Se eu fizer um suco de laranja, por exemplo, minha respiração já começa a ficar mais difícil”.
Exames
No Ceará, conforme descreve o boletim epidemiológico novo coronavírus da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), até ontem (6), 5.947 exames foram feitos no Laboratório de Saúde Pública (Lacen) e em clínicas privadas do Estado.
Segundo o gerente geral do DB Molecular, Nelson Gaburo, que tem laboratórios conveniados em Fortaleza, a “falta de produtos no mercado causada pela pandemia e o excesso de pedidos sem necessidade” têm sobrecarregado o serviços das equipes. “Como consequência, temos o racionamento de testes para aqueles que realmente necessitam, como pacientes internados a clientes que prestam o serviços”, disse Gaburo.
O laboratório Hermes Pardini, em Belo Horizonte, faz análise de testes enviados por clínicas parceiras da Capital cearense. “Estamos atendendo ou priorizando casos clínicos emergenciais”, destaca o vice-presidente, Alessandro Ferreira. A rede investiu na aquisição de aeronaves próprias e novas rotas aéreas para dar conta das solicitações. “Diariamente, o voo passa por Fortaleza para recolher as amostras e trazer para análise”, cita.
O Clementino Fraga realiza cerca de 15 a 20 exames por dia. As amostras são encaminhadas para o Lacen e um parceiro na cidade de São Paulo. Conforme explica a farmacêutica bioclínica e gerente de pré-analítico da unidade, Sara Menezes, a análise externa dos testes gera uma dificuldade de logística, uma vez que o laboratório paulista tem capacidade de recebimento de amostras limitadas por atuar em todo o País.
Para tentar atender à demanda, o laboratório dobrou a quantidade de carros e de coletores que fazem a coleta na casa do paciente. “A gente tem, sim, um controle de agenda. No começo, a fila de espera, eu diria, que estava até bem grande. Mas hoje não está mais tão longa porque a gente realmente aumentou a nossa capacidade de coleta”, pontua a enfermeira.
A psicóloga Roberta Costa não encontrou obstáculos quando procurou uma unidade de saúde da Capital para fazer o teste no dia 21 de março último. “Eu tive, inicialmente, muita tosse, moleza no corpo, diarreia e sintomas de uma gripe, aí a médica passou logo o exame”, revela Roberta. Porém, o prazo de entrega do teste que era de cinco dias úteis, até agora, esbarra em atrasos constantes.
“Quando chegou no período, eu liguei, e o hospital disse que era o Lacen que ia falar comigo e o Lacen respondeu que era o próprio hospital. Resumindo, até hoje não recebi nada. Eles informaram na semana passada que ia demorar 10 dias úteis e na quinta-feira (2) já disseram que o novo prazo era de 15 dias úteis, aí você fica na angústia de saber se está com a doença”, lamenta Roberta Costa.
Ainda de acordo com a psicóloga, a dúvida de não saber se testou positivo para a Covid-19, mudou a rotina de casa. “Tenho usado a máscara direto até na hora de dormir sozinha no quarto, higienizo as mãos a todo instante, separei a minha louça e não tenho tido contato direto com ninguém daqui”, cita.
Diário do Nordeste