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Surtos de dengue e de Febre do Nilo preocupam Ceará
Redação
Apesar de mutirões de combate ao mosquito Aedes aegypti, as arboviroses continuam sendo um vilão a ser combatido FOTO: NAH JEREISSATI

O período de chuvas inicia sentimentos controversos nos cearenses: o otimismo pelo alívio da crise hídrica e a tensão por problemas estruturais e de saúde. Uma das maiores preocupações é o aumento da incidência de doenças transmitidas por mosquitos, como as arboviroses, cujos vírus ainda circulam no Estado. De acordo com especialistas, zika e chikungunya não devem aparecer com maior intensidade – ao contrário das dengues tipos 1 e 2 e do vírus do Nilo Ocidental, ainda pouco notificado no Ceará, transmitido pela picada do mosquito Culex.

O Diário do Nordeste conversou com os pesquisadores Rivaldo Venâncio, coordenador de Vigilância em Saúde e Laboratórios de Referência da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz); e Luciano Pamplona, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFC), que apontaram probabilidades para o cenário das doenças no Estado.

Para Rivaldo, a expectativa maior se refere à ampliação da área de circulação do sorotipo 1 do vírus da dengue. “Foi um grande causador de casos no Sudeste e no Centro-Oeste, ano passado, e a tendência é de que se espalhe em especial para Nordeste e Norte, incluindo o Ceará. Chikungunya e zika também devem circular, mas sem grandes ocorrências no Ceará e em Pernambuco, por exemplo, que já foram muito acometidos”, projeta o especialista da Fiocruz.

Já Luciano alerta para o risco oferecido pelo sorotipo 2 da doença. “Temos quatro sorotipos diferentes da dengue, então temos epidemias com mais frequência. Ano passado, tivemos a reintrodução do dengue 2, e isso causou epidemia grande em 2019: foi a maior da história do Brasil. E o vírus já começou a circular aqui, no fim do ano. O que se espera para o Ceará em 2020, então, é um grande número de casos”, pontua.

Em 2019, até 9 de dezembro, foram confirmados 14.758 casos de dengue no Estado, número quase quatro vezes maior do que o registrado em 2018, que teve 3.720 confirmações. Ano passado, do total de casos, 13 resultaram na morte das vítimas, contra 11 em 2018. A doença predomina entre mulheres, e o sorotipo que mais apareceu nos municípios cearenses já foi a dengue tipo 1. Os dados são do boletim epidemiológico da Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), que não enviou os dados fechados de 2019.

Vírus “novo”

Contudo, para além do Aedes aegypti, outra picada “tem atormentado o sono de especialistas”, segundo Rivaldo: a do mosquito Culex. “Ele transmite o vírus do Nilo Ocidental, que tem sido diagnosticado em animais. Recentemente, no Ceará e no Espírito Santo, houve suspeitas de que ele possa ter causado a morte de alguns animais. Um possível surto no País inteiro preocupa, porque não temos anticorpos contra ele”, aponta.

O pesquisador da UFC, por outro lado, não acredita que haverá grande número de registros. “Febre do Oeste do Nilo é vírus novo, que já foi detectado no Ceará, mas que se sabe muito pouco sobre. É possível que haja novos casos, mas não tão numerosos quanto dengue. Será um aglomerado de casos isolados”, estima Luciano Pamplona. Solicitamos à Sesa informações sobre a ocorrência do vírus no Estado, mas a Pasta não enviou resposta até esta publicação.

Em seres humanos, a febre do Nilo Ocidental pode gerar, segundo Rivaldo Venâncio, “casos graves de comprometimento cerebral, como meningite (inflamação das membranas que revestem o cérebro e a medula espinhal) e meningoencefalite (inflamação do cérebro e dos tecidos circundantes). É muito parecido com dengue nos sintomas, mas numa pequena proporção pode causar danos ao Sistema Nervoso Central”. Apesar disso, o pesquisador aposta que “a probabilidade de ocorrência de epidemia de dengue ou chikungunya ainda é maior”.

O fato de serem doenças “que só se pega uma vez” torna menores as chances de disseminação da chikungunya e da zika em 2020, como aponta Luciano Pamplona. “Tivemos uma incidência muito grande de chikungunya durante 2016 e 2017, é provável que demore uns quatro ou cinco anos para se ter nova epidemia. Já zika é uma incógnita: como é um vírus muito ruim de detectar e que causa sintomas muito leves, não conseguimos mapear a circulação. Nunca se sabe se haverá muito ou pouco”, avaliao professor da UFC.

Assistência

O risco de novas epidemias, para o especialista da Fiocruz, implica diretamente na “desorganização” do Estado. “Há interferência não só no sistema humano, mas nas relações sociais e econômicas. Não deixam de acontecer acidentes de trânsito nem acidentes vasculares cerebrais, por exemplo, para que ocorra uma epidemia de dengue – ela chega numa comunidade e se soma. Isso interfere não só na rede de saúde, mas também na escolar, porque causa absenteísmo muito grande. Pode interferir no turismo, já que a tendência é que os turistas fujam dos locais de epidemias”.

Apesar de os arbovírus já serem conhecidos, a erradicação das arboviroses ainda é meta distante. “Muitas comunidades nas Regiões Metropolitanas têm precárias condições de saneamento, e a violência impede o trabalho dos agentes de endemias. Enquanto continuarmos com poucos vivendo com tanto, e tantos vivendo com pouco, sem resolver o problema habitacional, de coleta de esgoto e de fornecimento de água, não conseguiremos eliminar dengue, chikungunya, zika, Nilo Ocidental. É ilusão”, frisa Venâncio.

A reportagem solicitou entrevista com representante da Sesa para falar sobre as arboviroses, mas não foi atendida.

Diário do Nordeste

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